O trote!

 Por Marcos Almeida

João das Éguas era figura conhecida em Pocinhos do Rio Verde na década de 1970. Lembro dele, mas não em detalhes. Muito pelo que eu ouvia do que os outros falavam, menos do que eu mesmo poderia avaliar. Entretanto, o sentimento ao me recordar dele sempre foi bom. Ele tinha uns potros e éguas que desfilavam pelo pequeno povoado; me encantei uma vez pelo filhote, ao reparar o seu trote curto e um tanto desequilibrado.

Dito D’Ambrósio tinha uma fábrica de sabonetes do outro lado do rio e precisávamos contornar pela ponte ou pular o terrível “buracão”. Ele era músico de estupenda qualidade, mas também sonhador e enfrentava um negócio novo. Minha lembrança desse local é que tinha um telefone, daqueles que, para fazer uma ligação, era preciso discar, ou seja, rodar o disco introduzindo o dedo nos números correspondentes. Para ligar para alguém, naquele tempo, apenas três números eram necessários. Uma evolução, porque pouco antes, seria imprescindível contatar uma telefonista na central telefônica para realizar a chamada.

Zé do Correio, Ivete, Cida, Arlete e Zé Cândido
Maria Alice, Nilton, Marcos e Paulo (Bola)
Parque Balneário de Pocinhos

Certo dia, eu e meu amigo Paulo D’Ambrósio (o Bola), filho do Dito, só pensando em travessuras, combinamos em fazer alguma piada com algum desconhecido através de uma chamada telefônica. Nós, com 7 ou 8 anos, buscávamos em nossa imaginação como realizar a traquinagem. Aí, meu parceiro de arte pensou:

- Vamos perguntar se penico de barro enferruja?

- Vamos! Eu respondi, sem conseguir parar de rir.

Tiramos par ou ímpar. Eu pedi ímpar e ganhei. Fui o primeiro a executar o trote! Disquei 123 e alguém atendeu.

- Oi. É, tenho uma pergunta, é... penico de barro (ria muito enquanto falava) enferruja?

- Quem tá falando? Que palhaçada é essa? Respondia o interlocutor secreto.

Eu desliguei imediatamente e nós quase deitávamos no chão de tanto rir a cada pegadinha.

De repente, algum adulto percebeu o que estava acontecendo e recebemos um sermão bem dado. Além da conta que seria mais cara, fomos alertados que poderíamos ser presos pela polícia se alguém descobrisse. Lição aprendida.

Tanto o trote do potrinho quanto o trote ao telefone ajudaram-me a refletir que uma palavra pode conter significados diferentes. Precisamos superar a dificuldade em ficar apenas na superfície das mensagens, sem a essencial profundidade. Senão, cairemos na armadilha dos vieses inconscientes.

Saudades do Dito! E tenho dito!

Zé Cândido, Renata, Marcos, Arlete,
Cida, Jaime e Ivete
No Sítio (parreiral) da Pedra Branca

Vieses Inconscientes: o que são, tipos e exemplos - Psicanálise Clínica

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mais do que ver, que eu possa visitar!

Caixa de retratos

Zé do Correio, um pai extraordinário!